Por 15 anos, Maria, de 44 anos, dividiu sua casa com quem
achava ser o homem da sua vida. Juntos, tiveram dois filhos – além da mais
velha dela, que ele ajudou a criar. Apesar de quieto, o hoje ex-marido nunca havia lhe tratado mal. Até que as coisas mudaram.
Ou melhor, as drogas mudaram o homem, e
ele ficou agressivo. Maria foi espancada, duas vezes, por aquele que acreditava
ser o amor de sua vida. E, por pouco, não morreu.
Penha, de 31 anos, também tem problemas com o marido. Depois
que ela o flagrou usando crack, em
casa, percebeu que o casamento, já desgastado, não tinha volta. Arrumou
suas coisas, pegou os dois filhos do casal e foi embora. O marido a espancou, e
muito. Dias depois, ela ainda foi atropelada pelo agressor. E, até hoje, sofre
ameaças.
Nos dois casos, a droga é a motivadora da violência. Se antes
as mulheres afirmavam que o marido se tornava outro após o consumo excessivo de
álcool, atualmente apontam o crack como o principal vilão da violência
doméstica.
“As mulheres são
vítimas do crack, seja por parte de maridos dependentes químicos, seja por
parte de traficantes que abusam da dependência dessas mulheres”, diz a advogada
Tânia Pires, do Movimento Mulheres em Ação.
Nos casos de Maria e de Penha (nomes fictícios, em
referência à lei que protege essas mulheres), a agressão veio após o consumo de
droga. Na primeira vez que Maria apanhou do ex-marido, ela protegia os filhos.
Foi na Páscoa do ano passado. Ela pegou as crianças e fugiu. Escondeu-se na
casa de uma amiga.
Dias depois, o ex-marido a encontrou quando Maria conversava
com o irmão dele. “O olhar era de puro ódio. Ele correu atrás de mim enquanto
eu entrava pelo bar. Logo pegou uma garrafa de cerveja, daquelas de um litro, e
veio em minha direção. Usei toda a minha força para segurar a garrafa e
arrancar das mãos dele. Depois, só apanhei.”
Ela foi arrastada pelos cabelos. Tentou se proteger, abraçando um poste. Na rua, dezenas de
curiosos pediam para ele parar. “Ela é minha mulher. Ninguém se mete nisso”,
dizia o ex-marido, segundo Maria. A violência acabou só depois que um homem
armado, reconhecido por moradores como traficante, mandou o ex-marido largá-la.
No dia seguinte, ela
chamou a polícia e fez nova denúncia. Os dois foram encaminhados até a Justiça,
no mesmo carro. Ali, ele foi preso e deveria pagar fiança de R$ 1,5 mil. “Só não está solto,
porque não tem quem pague”, diz Maria.
Mesmo com a prisão, as ameaças continuam. Na última visita
na cadeia, o ex-marido disse que iria matá-la, e na frente da filha mais nova.
No caso de Penha, as ameaças vêm de um homem livre. O ex-marido é funcionário
público – trabalha numa prefeitura – e
responde a quatro processos, todos segundo a Lei Maria da Penha.
“Já tive arma apontada na minha direção, ligações e torpedos
de ameaças. Agora, ele usa minha filha para mandar recado. Aos amigos, diz que
me agrediu porque me viu com outro homem. Mas, na verdade, me bateu depois que eu o larguei. Não
aceitaria viver com um homem dependente do crack, ainda mais sendo tão
violento”, diz Penha.
Há um ano, Penha vive com medo. Não sai de casa sozinha.
Largou a faculdade, pois colegas eram ameaçados pelo ex-marido. Vive com o irmão, à espera de justiça. “Hoje, vejo que os dez anos de união eram um faz de
conta. Tenho medo do que pode acontecer com meus filhos, com minha família...
do que pode acontecer comigo”, frisa Penha.
Fonte: Maurílio Mendonça
gazetaonline.globo.com
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