terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Machismo 'invisível': comportamentos socialmente aceitos são igualmente destrutivos

Além das formas mais conhecidas de machismo, o dia a dia está impregnado por manifestações machistas que passam despercebidas, mas não deveriam!


Conversando com os colegas do site sobre relacionamentos, Márcia Rocha fez uma colocação na qual fiquei bastante instigado. Inclusive, foi esta indagação que proporcionou a reflexão deste texto. Conversávamos sobre preconceitos e a pergunta que ela me fez foi: ‘Qual o machismo que não me atinge?’

O machismo afeta diretamente as mulheres por uma questão da opressão e tudo que está implicado a isso. Desde questões históricas e culturais, o machismo é perpetuado na sociedade através de pequenos gestos que vão, desde um fiu-fiu na rua, atitude invasiva e abordagens que objetificam e exploram o corpo da mulher, concepções de que a mulher é um ser inferior e subalterno ao homem e que faz com que mulheres que realizam a mesma função no trabalho do que um homem, ganhem menos do que ele, até a um estupro e o feminicídio. Mulheres que são assassinadas pela cultura falocêntrica e patriarcal que impera na sociedade.

Dados recentes da ONU colocam o Brasil no sétimo lugar do ranking da violência contra a mulher. Violência que se expressa de todas as maneiras, social, psicológica, emocional, econômica, sexual e por aí vai. De fato, qual o machismo que não as atinge? Todos são, igualmente, destrutivos.

Quando falamos em machismo facilmente nos vem à mente agressões, estupro, violência doméstica, restrição econômica, submissão e subserviência. Acontece que o machismo é tão impregnado na sociedade por conta do patriarcalismo que não nos atentamos a pequenos gestos e comportamentos que são manifestações machistas e não percebemos. Tão imperceptíveis e automáticos, são assimilados com naturalidade pelas pessoas e por isso se tornam invisíveis.

O Manterrupting é uma junção de man (homem) e interrupting (interrupção) e significa ‘homens que interrompem’. Um comportamento que, além de falta de educação é uma forma de machismo, pois, a mulher não consegue concluir sua frase e raciocínio porque é constantemente interrompida pelos homens ao redor. Quer um exemplo disso?

Em 2009, durante seu discurso de agradecimento pelo prêmio de melhor videoclipe feminino do MTV Music Awards, a cantora Taylor Swift foi interrompida pelo rapper Kanye West. O cantor invadiu de forma agressiva e desrespeitosa o momento que era da cantora. O episódio ficou conhecido pelo gesto inesperado do rapper e tudo ficou em tom de brincadeira, mas que disfarça o ato machista.

Outro exemplo de machismo invisível é o Bropriating, um comportamento muito comum em reuniões. O termo é uma junção de bro (gíria para brother, irmão, mano) e appropriating (apropriação) e se refere a quando um homem se apropria da ideia de uma mulher e leva o crédito por ela.


O bropriating é mais uma das diferenças e injustiças que acontecem no mercado dos negócios sustentado pelo machismo. É o que faz com que muitas mulheres sirvam de trampolim para homens oportunistas crescerem à custa da submissão impostas às mulheres. Injustiça que faz com que as diferenças salariais relacionadas a gênero sejam bem acentuadas. Em um estudo recente realizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), mulheres ganham 30% menos do que os homens, mesmo que elas sejam mais instruídas ou capacitadas.

Já no Mansplaining, da junção de man (homem) e explaining (explicar) é a maneira como se explica, didaticamente, determinado assunto, como se a mulher fosse incapaz de compreender num primeiro momento. É quando um homem dedica um tempo para ensinar coisas triviais, simples ou não, mas que subestima a capacidade da mulher.

Outra situação é quando o homem quer explicar sobre algo que a mulher está certa, mas a explicação dele é baseada em dados e informações errôneas e desencontradas, apenas para convencê-la de que está errada. Um desmerecimento e desrespeito ao conhecimento da mulher. É tratá-la com inferioridade e menos capaz intelectualmente. Mulher, repare a maneira exagerada como as pessoas falam com você, elogios insistentes ou até mesmo, aquela mensagem acalorada de dias das mulheres, afinal, vocês merecem ser lembradas apenas no dia 8 de março?

Por fim, mais um exemplo típico de machismo invisível é o Gaslighting. Termo inspirado na peça de teatro ‘Gas Light’ e depois adaptado para o cinema. O enredo diz respeito a um marido que tenta convencer sua esposa e outras pessoas de que ela é louca. Tudo porque o marido quer a fortuna dela e só conseguiria se a esposa fosse internada como doente mental. Interpretando a esposa, a atriz Ingrid Bergman.

Utilizado desde 1960, o termo Gaslighting descreve a manipulação do sentido de realidade de alguém. Uma manipulação emocional e violenta, pois, embora este comportamento afete homens e mulheres, culturalmente, as mulheres sofrem mais pois sempre foram consideradas desajustadas socialmente e emocionalmente desequilibradas.

As famosas frases como: ‘isso é coisa da sua cabeça’, ‘você não sabe brincar’, ‘como você é exagerada’, ‘você está louca’ e ‘não vá chorar’. Isso é gaslighting. Vamos além, percebemos também este comportamento machista quando se diminui a importância da violência e agressão sofrida pela mulher. Uma desqualificação da autonomia e da palavra da mulher.

Um desempoderamento das mulheres e que infelizmente, muitos homens recorrem desta manipulação como recurso para oprimir as companheiras, que muitas vezes, se veem sem direção, abdicam das próprias escolhas e sucumbem à imposição do homem.

Acontece que a frase que escutei esses dias faz cada vez mais sentido, porque, embora seja homem, considero-me feminista e totalmente a favor dele. Devo, principalmente enquanto homem, desconstruir este machismo e este sistema patriarcal, que também é impositivo e violento com os homens. Eu não quero ser este homem que vive atrelado a este machismo.

Admito, sou um homem cansado destas exigências sociais e masculinas, enfadonhas e sem sentido. Que ‘bando’ de homens frágeis que precisam manter o machismo para existir. Não, eu cansei!!!

*Por Breno Rosostolato, psicólogo e professor da Faculdade Santa Marcelina (FASM).

Fonte: http://www.bonde.com.br/

Nenhum comentário: