Há cerca de dois anos, enquanto
passeava pela praça Tiradentes, no centro do Rio de Janeiro, o fotógrafo
Roberto Abreu experimentou uma sensação semelhante à que teve quando criança,
na cidade de Muriaé, na Zona da Mata de Minas Gerais. “Eu tenho uma memória da
minha infância, nas décadas de 60 e 70, em que a cidade tinha muitos
prostíbulos, como muitas do interior, e eu tinha um certo encantamento com esses
lugares proibidos. E muitos anos depois me deparei com situação parecida, bem
no centro do Rio de Janeiro”.
A partir deste “insight”, Abreu
começou a fotografar algumas garotas de programa da região, sem saber que o
resultado viria a ser um fotolivro, de 160 páginas, apresentado em uma mostra
no espaço cultural Ateliê da Imagem, no bairro da Urca, ontem à noite.
Conversando e convivendo com 20 mulheres neste período, o contato requereu
cuidados, e nem sempre resultou em imagens.
Ao final, o conteúdo reuniu seis
delas, algumas com idade entre 30 e 40 anos, e outras com mais de 60, revelando
um ambiente pouco conhecido, que foge da marginalidade associada à profissão.
“Elas são super cabreiras na abordagem inicial, então tive que ter uma
aproximação muito cuidadosa, até ganhar a confiança delas. Existe uma máxima na
fotografia que todo retrato é um autorretrato, um retrato seu sobre o fato.
Então, mais do que consentimento delas, precisei transmitir cumplicidade,
inclusive bebi cerveja com elas”, lembra o artista.
“Em nenhum momento eu quis passar
um olhar de piedade, elas não estão lá porque foram excluídas da sociedade.
Durante todo esse processo eu não ouvi nenhuma história trágica, de abuso,
violência ou estupro, todas começaram com isso tendo outro trabalho. Então eu
tento transmitir a imagem como uma profissão qualquer”.
Até por isso, uma das personagens
mais marcantes durante o processo não figura no trabalho final de Roberto
Abreu. “Eu queria muito fotografar uma senhora, muito simpática e risonha, mas
ela não topou participar porque trabalha na casa de uma família há 30 anos, tem
a própria família e independência financeira, não dependia disso pra
sobreviver, mas contou que é uma profissional do sexo por prazer”.
Para conseguir passar tudo isso nas
fotografias, ele contou com um aliado: o ambiente. “Todas as fotos foram
tiradas no hotel onde elas trabalham. E este hotel, em algum período entre os
anos 2000 e 2005, foi todo grafitado. É até engraçado porque é um hotel meio
decadente, mas lindo, com paredes que exalam sensualidade.”
O nome. Foi justamente este
cenário que consolidou o título do fotolivro. “Eu tinha acabado de fotografar
uma das garotas, ela estava se levantando e se vestindo quando vi um grafite
escrito ‘Confere com o original” bem ao lado das pernas dela. Nesse momento, eu
pedi para ela parar, tirei uma foto e, ao mesmo tempo, encontrei o título pro
trabalho, porque acho que tem tudo a ver com a proposta”.
Fonte: O Tempo
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