O telefone toca. Do outro lado, uma voz um tanto nervosa.
Uma mulher. Faz questão de não ser identificada. Quer fazer uma denúncia,
segundo ela, “muito séria”. Não espera nem mesmo perguntar contra ou sobre o
que e começa a desfiar seu rosário de queixas. “É impressionante o número de
adolescentes (e até crianças) entrando e saindo dos motéis, estes que ficam
aqui, próximo a Aparecida de Goiânia”, despeja, para em seguida lamentar: “O
pior é que não se vê ninguém, nem polícia, nem Conselho Tutelar, nem Ministério
Público, ninguém mesmo, fazendo alguma coisa para coibir esta prática.”
A mulher queixosa não dá tempo sequer para uma pergunta e
vai logo dizendo: “Meu marido trabalha de vigia em um desses motéis, mas nada
pode fazer, pois se o fizer perderá o emprego e não teremos como cuidar de
nossos filhos. Ele me conta que fica envergonhado ao ver, no início da noite,
aqueles homens chegando com meninas e meninos escondidos nos porta-malas ou
pelos vidros escuros do banco de passageiros. Ele sabe, conhece muito bem
quando o(a) acompanhante é menor de idade. Trabalha faz tempo na área”, reclama.
Ela lembra que, recentemente, leu reportagem no Diário da
Manhã que revela a existência de pelo menos 120 pontos de exploração sexual
infantil e que estes mesmos pontos seriam alvos de alertas por parte da Polícia
Militar. “Mas, depois disso, não ouvimos mais nada acerca do assunto. Espero
que não tenha caído no esquecimento.”
Rosa, vamos chamá-la assim, diz que a polícia até que passa
nas redondezas, “mas não faz nada, não tem abordagem alguma, talvez pelo fato
de os veículos serem de luxo e seus condutores homens tidos como de ‘bem’ no
meio social. É uma vergonha. Tem político, tem gente graúda e até religiosos
envolvidos neste esquema. A prática da pedofilia é constante”, diz.
A mulher continua com sua perplexidade. A voz embargada
sugere, inclusive, que tenta segurar o choro de revolta. “Não acredito que as
forças policiais não tenham conhecimento dessas barbaridades. É tudo feito às
claras. O entra e sai dos motéis é constante. Ou será que o luxo dos carros
ofusca a vista de quem deveria zelar pela segurança da população? Só pode ser
isso”, afirma.
Rosa, no entanto, acredita que nem tudo está perdido e
lembra que, em 2013, o comandante 15º Comando Regional de Polícia Rodoviária
(15º CRPM), coronel Carlos Antônio Borges, adotou um projeto idealizado pelo 1º
sargento, Rosemário justamente para tentar coibir a prática da pedofilia e da
exploração sexual de crianças e adolescente, criando, inclusive, um canal
voltado a atender denúncias acerca deste crime, que é o Disque 198, que atende
diuturnamente.
Nos seis meses de implantação, o sargento Rosemário e outros
integrantes do 15º CRPM têm realizado palestras, visitado escolas, conversado
com taxistas e caminhoneiros, com mototaxistas e outros profissionais no
sentido de esclarecer a todos sobre os males da pedofilia e da exploração
sexual de crianças e adolescentes.
“Ainda assim, acho que é como uma andorinha desgarrada do
bando, não faz verão. Uma ação como essa deveria receber um apoio maior. O
envolvimento deveria ser de toda comunidade, principalmente dos governantes e
suas forças de segurança. Não é possível saber da existência de uma situação
como essa e ficar de braços cruzados, esperando que algum familiar ou uma
pessoa comprometida com a moralidade, com a cidadania e a civilidade, provoque a
autoridade oferecendo denúncia, que na maioria das vezes só chega ao
conhecimento policial depois do fato ter se concretizado”, lamenta Rosa.
Campanha
O Diário da Manhã ouviu o 1º sargento Rosemário Pereira de
Castro, da Polícia Rodoviária Estadual (PRE) responsável pelo Projeto Rede de
Apoio a Segurança (RAS) Não Desvie o Olhar, desenvolvido pelo Comando do
Policiamento Rodoviário (15º CRPM), em andamento, há mais de seis meses. Ele
garante que o 15º CRPM está fazendo a sua parte, e tem procurado conscientizar
motoristas acerca do assunto através de outdoors da campanha espalhados em
Goiânia e Região Metropolitana, além de ter firmado parcerias com taxistas,
caminhoneiros, postos de combustíveis, motéis e toda a sociedade goiana, na
denúncia contra a prostituição e exploração sexual infantil, por meio de
ligações feitas para a emergência nas rodovias goianas, através dos telefones
198 e 100.
De acordo com ele, Goiás é o quarto Estado brasileiro com o
maior número de denúncias de prostituição e exploração sexual infantil. “O
comandante do 15º CRPM abraçou o Não Desvie o Olhar, no Estado de Goiás, por
entender que a luta contra a prostituição e exploração sexual infantil é nossa
obrigação, como cidadão e policial militar e não queremos, nestas condições,
ver Goiás engrossando essa estatística”, diz.
Ele explica que a Polícia Militar do Estado de Goiás é a
primeira, a nível de Brasil, a disponibilizar um telefone de emergência para
receber denúncias de exploração sexual infantil durante as 24 horas do dia. “O
nosso projeto é único e gostaríamos muito que todas as polícias militares do
País disponibilizassem um telefone (198) para denunciar esse tipo exploração”,
declara o militar.
De acordo com ele, já foi feito um levantamento de todos os
pontos de exploração sexual em Goiás. “Hoje, nas rodovias goianas, nós
identificamos aproximadamente 120 pontos de exploração sexual infantil, os
quais não podem ser divulgados para não prejudicar as investigações”,
esclarece.
O sargento Rosemário garantiu que a RAS planeja, em 2014,
firmar novas parcerias com as escolas, para a realização de palestras sobre o
assunto, voltada para o público entre 12 e 18 anos. Outra novidade apresentada
pelo projeto é a parceria com o Laboratório Público Municipal de Aparecida de
Goiânia, que disponibilizará atendimento, das 7h às 19h, para a realização de
exames de DST, para menores de idade, com a autorização dos pais, e público em
geral. “Para maiores esclarecimentos, as pessoas podem entrar em contato com a
doutora Daniela Fabiana, responsável.
Fonte: DIÁRIO DA MANHÃ (Antéro Sóter)
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