quinta-feira, 29 de março de 2012

Apologia da prostituição na Copa em Mato Grosso


A pouco mais de dois anos do início da Copa do Mundo no Brasil, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso e a Polícia Civil de Várzea Grande, cidade próxima à capital Cuiabá, uma das sedes do mundial, investigam uma agência de modelos itinerante suspeita de usar sem autorização produtos da Fifa e ainda infringir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

De acordo com a Procuradoria Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente de Mato Grosso, o grupo "Garota Copa Pantanal 2014" divulga na internet vídeos e fotos de garotas menores de 18 anos em posições sensuais com camisetas promocionais alusivas ao torneio de futebol. A Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, da Criança e do Idoso em Várzea Grande apura o caso. A Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo (Secopa) em Cuiabá também foi acionada.
Procurado pelo G1, o responsável pelo grupo “Garota Copa Pantanal 2014”, Reinaldo Luís Akerley Cavalcante, de 40 anos, negou as suspeitas de que poderia estar explorando sexualmente as garotas. A delegada Daniela Silveira Maidel aguarda nesta quinta-feira (29) o dono da agência de modelos para depoimento.
A pedido do procurador Paulo Roberto Jorge do Prado, a delegada instaurou inquérito em 9 de março para investigar se os responsáveis pela agência de modelos cometeram crime de exploração sexual ou prostituição de criança ou adolescente. Procuradoria e Polícia Civil também já solicitaram à Justiça a retirada dos sites usados pela empresa para divulgar as imagens das adolescentes.
Segundo Cavalcante, responsável pelo site, ocorreu uma "falha" na produção das imagens que mostram menores de idade em poses sensuais e isso será avaliado pela equipe de trabalho do seu curso de modelos. "Nosso objetivo não é mostrar sensualidade. É mostrar a beleza da mulher pantaneira", afirma Cavalcante, dono da Reynaldo Eventos Comunitários. De acordo com ele, as garotas integram um grupo itinerante de modelos que "leva a beleza da mulher matogrossense e ajuda a divulgar a Copa do Mundo em Cuiabá".
A polícia diz que já ouviu cinco adolescentes, e todas negaram ter sido vítimas de exploração sexual ou prostituição. Entre o final de fevereiro e o início deste mês, o procurador Paulo Prado encaminhou ofício à Secretaria de Estado de Segurança Pública do Mato Grosso solicitando a abertura de inquérito da Polícia Civil porque, no seu entendimento, o conteúdo das imagens que estão sendo veiculadas com as garotas na internet fere o artigo 244 A da Lei 8.069, de 1990, do ECA, que trata das questões e punições relacionadas a quem submete menores "à prostituição ou à exploração sexual". A pena prevista para quem comete esse tipo de crime é de "reclusão de quatro a dez anos, e multa".
A Secopa comunicou à agência sobre o uso indevido da marca da Fifa. A entidade pediu para Cavalcante retirar a logomarca da federação das camisetas e não usar mais o nome "Copa 2014". De acordo com o governo do Mato Grosso, não há nenhum vínculo entre a administração e o evento.

Camiseta molhada
 O site do grupo mostra integrantes de 14 a 17 anos. Elas aparecem nadando em piscinas e se banhando em chuveiros. As adolescentes usam biquínis - alguns fio dental -, camisetas molhadas - uma chega a erguer a roupa para mostrar o sutiã do traje de banho -, shortinhos, minissaias - a calcinha de uma aparece nas imagens -, e decotes.
 Os vídeos começam com a imagem do colo de uma garota com a camiseta com o nome do grupo. Além de focar os seios das participantes, os closes também valorizam os bumbuns. As garotas dançam, sorriem, mandam beijos ou fazem "coraçõezinhos" com as mãos ao som de músicas como, por exemplo, "Baby", do cantor canadense Justin Bieber.

Viagens
 Apesar de o evento "Garota Copa Pantanal 2014" ter surgido na cidade de Várzea Grande, que faz limite com Cuiabá, ele levou as garotas para locações em piscinas, parques aquáticos, hotéis, pousadas no meio da mata, cachoeiras, rios, lagoas e praias espalhados pelo Brasil. As candidatas já foram filmadas e fotografadas de dia e de noite em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, onde estiveram durante o carnaval deste ano.
Num vídeo de três minutos de duração, postado em abril de 2011, no qual mostra uma adolescente de biquíni fio dental, então com 14 anos, uma mensagem sugere que as candidatas podem fazer viagens internacionais: "Vou sim, amigo, vou entrar em contato para marcarmos a ida das modelos da Copa do Mundo 2014 a Lisboa", escreve um dos organizadores.
No site do grupo, uma notícia postada no dia 6 de agosto de 2011 informa que a mesma garota irá para Zurique, na Suíça, em 2013, participar do sorteio das sedes da Copa das Confederações, que também ocorrerá no Brasil. Atualmente, essa participante está com 15 anos.
"Não podemos vender a imagem do Brasil como um palco de prostituição infantil. Não podemos admitir que isso aconteça e que essa imagem seja vendida. O que o estrangeiro vai pensar? Que é um subpaís onde ninguém liga para suas crianças e adolescentes? Existe um fator da proteção que é necessário aqui. Os responsáveis estão se promovendo de forma fraudulenta, no mínimo", afirma o procurador Paulo Prado.
 No documento que Paulo Prado encaminhou em 29 de fevereiro ao secretário de Estado de Segurança Pública de Mato Grosso, Diógenes Gomes Curado Filho, ele pede a "devida instauração de inquérito policial e a retirada imediata da exposição dessas jovens da internet".
 No ofício, a Procuradoria da Criança e do Adolescente informa que há "exposição indevida de meninas entre 13 e 18 anos de idade, em trajes sumários [...], tendo como agravante o fato de estarem autorizadas por familiares e genitores".
Na página do evento, as idades das participantes aparecem nas suas fichas técnicas com as fotos correspondentes. Há uma descrição que informa que todas as menores têm autorização dos pais e responsáveis para participar das sessões de fotos e filmagens.
  Crimes
 Procurada, a delegada Daniela Maidel, da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, da Criança e do Idoso em Várzea Grande, disse que investiga se os organizadores da agência de modelos cometeram crime. "Recebemos informação do Ministério Público sobre existência dos sites. Diante disso, instauramos inquérito policial para apurar o crime de submeter criança ou adolescente à prostituição ou exploração sexual, de acordo com o artigo 244 do ECA. Também pedimos a Justiça a retirada desses sites da internet."
No entendimento da delegada, as imagens das garotas não devem ser divulgadas na internet. "Os vídeos dão a entender que elas estão ali dispostas a ser agenciadas para programas. Mas ao mesmo tempo, os sites dão uma sensação de legalidade ao postar vídeos com uma garota vestindo uma camiseta alusiva à Copa, como se existisse algum órgão oficial por trás do evento. Mas isso não é verdade porque tivemos informação que a Secopa não tem vínculo com essa agência e já está tomando medidas administrativas para impedir o uso de imagens de símbolos da própria Copa com o grupo de modelos", afirma Daniela Maidel.
 "Até agora, não encontramos nada que comprove exploração sexual ou prostituição em relação a essa agência, mas vamos avaliar se a agência incorreu em crime também ao usar incorretamente a imagem da Fifa. Se isso ficar comprovado, vou sugerir que alguma outra delegacia investigue o caso", afirma a delegada.
Cinco adolescentes que integram o grupo "Garota Copa Pantanal 2014" foram ouvidas na semana passada pela delegada. "Elas vieram acompanhadas das mães e negaram ser vítimas de exploração sexual ou prostituição. Ouvimos as meninas em separado também. As mães disseram que deram autorização às filhas para integrarem o grupo e viajarem com os organizadores dos concursos. Mas procuramos outras jovens. Elas consideram posar com biquínis sumários a coisa mais natural possível. Consideram como um trabalho de modelo. São meninas de famílias humildes, são pessoas simples que se deslumbram com a esperança da fama. Em vários outros eventos percebemos que meninas são iludidas. Isso é perigoso."
Mesmo que a Polícia Civil não encontre ligação dos vídeos com uma suposta rede de exploração sexual ou prostituição de adolescentes, os responsáveis pela agência deverão ser responsabilizados pela veiculação das imagens das menores em poses sensuais na internet. "Temos que ver qual a intenção dessa agência ao expor as imagens. O que ela ganha com isso? Eu entendo que o simples oferecimento das garotas, a intermediação com agenciadores, configura exploração sexual ou prostituição", afirma Daniela Maidel, que apura também a existência de outra agência de modelos que estaria usando o indevidamente o nome da Copa do Mundo de 2014 em Cuiabá para promover garotas.
"Tem que ver se a agência intermediou, propôs ou marcou encontro das adolescentes com alguém. A exposição das imagens poderia incorrer em outros crimes, mas tudo leva a crer que houve também exibição das imagens das menores com o intuito de exploração sexual”, diz. "Tenho informações de uma das garotas que ouvi que esse outro grupo a teria oferecido para fazer programas sexuais".
Fonte: O Documento

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